Um dia, um sujeito simples, mas de muita energia, decidiu largar um concurso público para buscar um sonho de adolescente. Em toda sua juventude escutou que os melhores empregos eram os conquistados por meio de concursos públicos, pois davam a estabilidade a quem quer que fosse. Só que depois de se desestabilizar emocionalmente por completo mergulhado na mentalidade e cultura do serviço público brasileiro, ele decidiu dar um bico na mesa. Esse cara sou eu.
Onde se batem carimbos
Acumulei 2 anos de funcionalismo público pela Prefeitura de Belo Horizonte/MG e 4 anos pela Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG). Nesse período, vivenciei algo que realmente eu não gostaria de ter vivenciado: a falta de compromisso com a população por grande parte dos servidores das repartições públicas do país – chamo atenção para o significado da palavra ‘servidor’.
Acredito que haja setores e pessoas mais compromissados do que outros, mas, no geral, é uma terra onde a palavra servidor se desvirtua do seu propósito original. O foco que deveria ser no interesse público se volta à questões particulares e manutenção de cargos. Se buscarmos nos textos gregos antigos, realizaremos que essa é a estrita definição de corrupção. Lamentável.
É muito comum que um serviço não precise ser eficiente, não precise ser rápido, mas precise atender algum interesse pessoal e, geralmente, político. Bata seu carimbo para que as coisas corram bem! Se você almeja uma mudança do status quo, você está no lugar errado, meu amigo. As brincadeiras ilustram:
– Novato, você já tem carimbo?
– Não.
– Então fique tranquilo, mas você não é ninguém aqui ainda!
Sério! Eu escutei isso!
Nada que não precise ser rápido deve ser rápido! Tudo pode (e deve) ser bem devagar a menos que quem chefie a seção diga que seja para ontem. Se você tentar fazer qualquer tipo de mudança cultural ou sistemática, você será visto com maus olhos. Não estou aqui fazendo uma ode negativa às instituições públicas de maneira sistêmica, pois seria falacioso, mas, sim, fazendo alusão a Hamlet¹: “Há algo de podre no reino da Dinamarca”.
Partindo disso, juntei minha decepção com dois desejos de praticamente toda vida: morar na praia e estudar filosofia. Quando mais jovem, não tive a coragem de correr atrás de nenhum dos dois para realizá-los. Tomei coragem (que não tem a ver com ausência de medo) e pedi demissão daquele concurso. Fui chamado de louco, claro, mas trilhei o caminho. Se tiver medo de tentar realizar algo que deseje muito, mas não saiba por onde começar, clique aqui.
O olhar das crianças
Se você caiu de paraquedas nesse blog, saiba que esse é o primeiro de muitos textos que registrarei aqui. Não pretendo consumir sua valiosa hora aqui nesse site falando sobre mim, embora talvez aproveite uma ou outra história para passar uma mensagem.
Para dar o primeiro passo no cumprimento do propósito desse blog, vou utilizar uma perspectiva que é comum abandonarmos em nossa história: o olhar das crianças.
Já reparou como as crianças possuem uma percepção diferente? Elas estão sempre buscando entender, desenvolver e aprender algo novo. Há pessoas que mantém esse olhar curioso ao longo da vida, mas infelizmente esse olhar não parece fazer parte da cultura do tipo de ambiente que são as repartições públicas. É comum, na medida que envelhecemos, perdermos essa capacidade de buscar aprendizado. Se você frequenta um ambiente que não exige isso então…
Crianças costumam ser mais exploradoras, cheias de energia e atentas a detalhes que podem passar desapercebidos para maioria dos adultos. Na ponta oposta dessa visão, há um espírito crítico exagerado que pode esconder algumas coisas importantes. Para uma criança de 3 anos que observa uma borboleta, não há história de borboletas, significados de borboletas, críticas, julgamentos ou lagartas por trás da borboleta, mas apenas uma borboleta. Ela olha e olha curiosa para a borboleta… Apenas olha com atenção.
Mas à medida que vamos crescendo, vamos formando nossa personalidade e internalizando padrões, alguns que podemos chamá-los de preconceitos – que são úteis em certa medida para essa máquina forjada no paleolítico que somos – e, assim, aquele olhar leve vai se esvaindo deixando lugar para um outro tipo de olhar. Um tipo de olhar mais crítico.
O olhar maduro
A crítica é algo que só aparece com a maturidade. O pensamento crítico vai sendo construído a medida que vamos observando padrões e repetições, além de, claro, nossos erros. Algumas pessoas não a desenvolvem a ponto do foco se voltar para a própria pessoa. É comum pessoas, mesmo em pessoas mais velhas, se empacarem em uma eterna adolescência mental por isso.
Uma visão crítica é interessante para não acreditarmos em qualquer coisa e perdemos a inocência diante tentativas de venda de produtos ou serviços ardilosos. Embora, todos estejamos sujeitos a erros e a sofisticação de golpes, um espírito crítico nos ajuda a ser melhores e mais assertivos nas decisões do dia a dia, além de mantermos conversas que demandam um pouco mais de seriedade como política em um nível mais alto.
Porém, quando a crítica toma conta por completo da pessoa, fazendo com que a pessoa abandone totalmente a inocência de criança, pode produzir efeitos não muito interessantes. Todo mundo conhece uma pessoa que critica tudo e todos o tempo todo. Um excesso de crítica pode fazer com que nos tornemos inflexíveis e quebradiços. Podemos ferir pessoas a nossa volta. Ou ainda, podemos ser tão rigorosos com nossos próprios projetos que podemos cair em um eterno ciclo de frustração.
Essa abordagem está no nível comportamental. Embora, este nível não seja a única perspectiva de todo nosso espectro mental, não podemos ignorar essa esfera psicológica tão estudada por diversos autores como Thorndike, Watson e, principalmente Skinner, famoso psicólogo comportamental e professor de Harvard.
Fica aqui o convite para observar mais e apenas observar. Junte isso com uma profunda respiração. Rebuscando nosso olhar curioso de criança, que deixa a vida mais leve, que nos ensina e nos leva a lugares abstratos, mas também possíveis. A criatividade bate à porta de pessoas flexíveis. Sem adotar essa postura, a maioria das pessoas simplesmente faz como na história do Pernil da Srta. Rosa, repetindo as coisas sem ter a consciência do que estão fazendo e se mantêm em um ciclo interminável da corrida dos ratos². Os dois tipos de olhares se complementam. Não são perspectivas concorrentes.
¹ Referência à famosa obra Hamlet de William Shakespeare.
² Referência ao livro ‘Pai rico, pai pobre’ de Robert Kiyosaki e Sharon Lechter, onde o ciclo que não é próspero é chamado de corrida dos ratos, pois remete aquele brinquedo na gaiola onde eles correm e não saem do lugar.